ANDAIME - Bailéu

01 junho 2016











Depois da apresentação do Andaime, só agora encontro um tempo para escrever sobre este espetáculo apresentado pelo RFEA no passado dia 27 de maio no Cine Teatro Paraíso.
Desde o início do ano que estava agendado no nosso plano de atividades o ANDAIME, mas se quisermos ir à origem deste espetáculo temos que recuar até julho do ano passado, quando levámos o Pulsações no Entroncamento, não foi por acaso que a foto escolhida para o cartaz foi lá tirada.
Na altura a logística “obrigou-nos” a colocar a tocata e cantata em andaimes, surgindo ali a ideia de fazer um espetáculo utilizando uma estrutura de tamanho, material e utilização diferente das “nossas” habituais cadeiras.
Claro que o Andaime que nasceu nesse dia, estava longe do ANDAIME apresentado ao público, esse resultou de muitas horas de trabalho, já que a criatividade não aparece num estalar de dedos (às vezes é preciso “estalar-se” muitas outras coisas), de muitos longos e exigentes ensaios, da convivência com dores musculares, frustrações, dificuldades e cansaço.
Qualquer obra de arte, exige tempo, dor, paciência, amor, dedicação ao mesmo tempo que é esculpida, pintada, trabalhada…
Este Andaime se ao espetador pode parecer de fácil execução, exige minúcia, treino, dedicação, repetições várias do movimento e uma entrega total não só de corpo, mas principalmente de alma.
É exigente na linguagem, no pormenor, nos momentos de silêncio, que alguns dizem ser em demasia, mas os necessários para fazer luto… interiorizar a morte, a dor e a perda, tal como (deve) acontece na nossa própria vida.
Andaime fala da morte das tradições, usos e costumes dos nossos antepassados, e do estigma que o Folclore continua a ter. Vai-se lá saber porquê continua a ser olhado de lado, mal- tratado, apertado, esmagado...
Também a atividade rural parece desaparecer à velocidade com que morrem as gentes mais velhas que ainda cultivam a terra e a amam.
E se à primeira vista parece ser a morte das nossas tradições, que foram transmitidas de geração em geração, a verdade é que essa morte que tantos anseiam e agoiram, tal abutres sempre prontos a comer o que dela possa ainda restar, eis que ela renasce, pura, simples, sem pretensões, despida…. Desprovidos daquilo que somos e acreditamos parece ser mais fácil engaiolar-nos.
E esse Andaime que nos poderia levar mais alto, mais longe, torna-se o nosso aprisionamento, a nossa gaiola.
Envolvidos no nosso dia a dia, correndo de um lado para outro, atordoados pelos sons da “cidade”, tornamo-nos verdadeiras aves de capoeira, incapazes de outros voos.
Nessa correria somos por vezes atropelados por uma dor maior, a doença, a perda de alguém que amamos, a solidão, são esses momentos que nos levam ao "fundo do poço", e onde o silêncio ganha voz e grita: acorda, levanta, reage!
Somos invadidos por “sonhos” destruturados, por memórias que embora longínquas nos invadem, inquietam e questionam... tradições, lendas, contos, provérbios, canções, danças, jogos, religiosidade, brincadeiras infantis, mitos, idiomas e dialetos, adivinhações, festas e outras atividades culturais que nasceram e se desenvolveram com o povo, povoam agora os sonhos daqueles que têm memórias, lembranças, recordações.
E a tradição que muitos pensavam ter enterrado e "comido", ganha cheiro, cor, movimento, voz... e leva ao encontro e ao desenvolvimento de laços familiares e comunitários, contribuindo para o equilíbrio emocional entre as pessoas.
E assim continuará desde que seja transmitida às gerações futuras.
Andaime pretende olhar para aquilo que já fomos e que é importante voltar a ser.
Foram muitos os que ajudaram a colocar este ANDAIME "de pé".
A todos os meus sinceros agradecimentos. Aos componentes do RFEA, obrigada principalmente pela confiança que em mim depositam, foram e continuarão a ser fonte de inspiração.
Ao Zé, pela sua presença nos diferentes momentos deste trabalho mas, principalmente, por ser um amigo-irmão-companheiro, estando presente onde eu estive ausente.
Ao Hugo pela disponibilidade, confiança e estímulo. Tenho a certeza que sem o seu talento, inteligência, e perspicácia este Andaime não chegaria tão longe e tão alto.
Ao António Ferreira, Fernando Nunes e Paulo/Carla Honório, pela disponibilidade em ajudar em questões técnicas, tais como cedência de andaimes, luz e espaço.
Dedico este trabalho à minha família (a de sangue e a de coração) que sempre acreditou e tudo fez para que eu também acreditasse que cada um pode construir o seu caminho, com respeito ao próximo, com ética e coragem para transpor todos os obstáculos.
A força para alcançar este propósito, reside em cada um. Sustenta-se principalmente na capacidade de amar incondicionalmente, na sapiência de doar e, também de receber.

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