Saborear os sentidos de Alviobeira, numa ronda pelas
artes e ofícios foi a proposta do RFEA para o domingo, 10 de dezembro.
Desde 2019 que a ronda estava parada, devido a dois
anos de pandemia e um último ano que optámos pela realização do Mercado à Moda
Antiga em detrimento da Ronda. Este ano deixámos o mercado para 2024 e optámos
por fazer mais uma Ronda.
Desde a escolha do percurso, dos espaços a visitar,
das atividades a realizar em cada paragem, até à preparação da comida:
mata-bicho, almoço, buchas e ceia, muitos são os pormenores a preparar e a ter
em atenção.
Ao realizarmos uma Ronda, sabemos de antemão que
estamos a trabalhar no campo das emoções e por isso, nada será fácil, mas ao
mesmo tempo torna-se aliciante e inspirador.
Damos tudo a esta Ronda, muito é o trabalho físico e
mental, mas sabemos que iremos receber muito mais; encontros, partilha de
histórias, dádivas, ofertas, “portas escancaradas” que nos enchem a alma e
fazem-nos acreditar que a generosidade existe e que a humanidade ainda tem
futuro.
Mas nem tudo são rosas. Na preparação de qualquer
Ronda há sempre contratempos, e esta ronda também os teve, não os suficientes
para baixarmos os braços, pelo contrário, foi nas adversidades que encontrámos
força para prosseguir, sempre com o objetivo de proporcionar experiências
sensórias únicas.
Houve de tudo, desde quem nos quisesse fazer acreditar
que as paredes não falam, que se trata apenas de “casas velhas” desprovidas de
história e memórias; mensagens com um simples “não…de todo não”, recebemos
títulos de manipuladores, quando apenas tentávamos explicar o propósito da
ronda, utilizando exemplos para clarear as nossas intenções… enfim no fundo,
tudo serviu de reflexão e aprendizagem.
Só agora, para quem não nos conhece, deixar aqui bem
claro que a nossa “área científica também sempre esteve ligada à investigação,
desde a arqueologia, etnografia e defesa do património”, valorizamos, no
entanto, os quatro elementos da aprendizagem: aprender a conhecer, aprender a
fazer, aprender a conviver e aprender a ser…e sim, às vezes é preciso muita
conversa. Neste grupo, ainda acreditamos no poder das conversas, como
ferramenta para mudar o mundo. Desde o início da humanidade, as conversas têm sido
a principal forma de comunicação entre as pessoas. Elas permitem-nos expressar
os nossos sentimentos, compartilhar as nossas ideias e trocar informações.
Falemos agora de coisas mais importantes e produtivas.
Nesta ronda revivemos vários ofícios: sapateiro, barbeiro, alfaiate,
bordadeira, costureira, cozinheira, boleira e ourives. Atravessámos épocas,
adequando a indumentária aos espaços e épocas retratadas. Saboreamos “petiscos”
uns feitos pelos componentes do Rancho e/ou pelos seus familiares, outros
cedidos por alguns benfeitores que apenas perguntam: “O que é preciso fazer?” O
arroz doce e os bolinhos da Isabel, a torta de bacalhau, carapaus fritos e bolo
da Cesaltina, o bolo chifom da Guilhermina, as tigeladas do Sr. Armindo e o
vinho do Abel e do Ezequiel, tornaram as nossas mesas mais apetitosas.
Quanto aos espaços visitados começamos com a
simplicidade das casas antigas da aldeia,
a casa do Ti sapateiro, da Ti Palmira e do Ti Padeiro,
a Casa da Ti Gracinda, a tasca do Candonga, Barbearia, a adega e oficina do
Crespim, onde se encontrava o tanoeiro Houve ainda tempo para uma visita à
antiga escola primária de Alviobeira (onde se realizaram as inscrições) e uma
passagem pela fonte da aldeia.
Partimos depois em direção a Cêras, para visitar a
casa do antigo Ourives, o Sr. António e sua esposa, a menina Judite. Uma casa
antiga, bem imponente, situada em pleno Caminho de Santiago, bem perto da ponte
de Cêras. O espaço está para venda e tem grande potencial, esperemos que
encontre um dono capaz de devolver a dignidade a esta casa tão bem situada e
com uma luz incrível.
Fomos até junto à ribeira, agora limpa, um trabalho da
junta de freguesia, e ao som da água a correr na ribeira, juntou-se as notas de
música que saiam do violino do Filipe.
Próxima viagem foi em direção ao Casal Velho, à casa
do Sr. André e da Srª Sandra, onde ouvimos as vozes femininas numa homenagem às
mães. Para homenagear a presença feminina da casa, de nacionalidade brasileira
escolhemos Romaria, uma canção composta por Renato Teixeira em 1977. De letra
simples, a música tornou-se muito popular por homenagear Nossa Senhora
Aparecida, a padroeira do Brasil, e também por fazer referências ao caipira e
ao romeiro.
Seguimos em direção à Igreja Nova, mas fizemos antes
uma paragem na cozinha da Maria Lourenço, conhecida por muitos os que iam na
Ronda, pois foi a cozinheira e boleira dos casamentos na década de 60/70.
Ouvimos dizer várias vezes:” foi ela que fez a boda do meu casamento!”.
Já na Igreja Nova, encontrámos a Quinta José &
Maria, uma casa verde, ali bem perto da AMI. Podemos ler no seu Instagram “uma
família luso-brasileira remodelando uma casa de 1940 com as próprias mãos”. É
isso, o casal Paula e Vanderley compraram esta casa e desenvolveram um trabalho
espantoso de recuperação. Dizem que não foram eles que escolheram a casa, mas
que foi a casa que os escolheu, foi sem dúvida a melhor escolha.
Atualmente a casa recuperada é um alojamento local e
recebe hóspedes/ amigos de todos os lados do mundo.
Quando lá chegamos já as portas estavam abertas de par
em par. O grupo de cerca de oitenta pessoas entrou casa dentro e visitou
tranquilamente todas as divisões da casa.
No terraço da Casa, que tem uma vista fabulosa, leu-se
um poema de Alberto Caeiro (da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver no
universo…) e a Balada da Neve de Augusto Gil, ao som do violino tocado pelo
Filipe.
Animados pelo acordeão do Tomás e cantorias, chegámos
ao Valgamito à Quinta das Pinheirinhas, que prima pelo requinte, bom gosto e
cuidado nos pormenores.