A TRADIÇÃO DA MATANÇA DO PORCO

06 março 2019
















Antigamente a matança do porco era um momento de convívio sociofamiliar e ao mesmo tempo garantia a subsistência para a família nos penosos meses de inverno.
Nos mercados e feiras escolhia-se e comprava-se o porco para a engorda, que era bem alimentado, durante um ano, com produtos da natureza e restos de comida e que podia vir a pesar mais de 200 kg.
A matança do porco é uma tradição que está associada ao frio e ao Inverno, realizava-se normalmente nos meses de dezembro e janeiro. O dia era marcado conforme as conveniências das pessoas que ajudavam, ou em dia de celebrações especiais.
Era verdadeiramente uma grande festa da família à qual se juntavam os amigos e vizinhos.
Chegado o dia da matança, começava a juntar-se as pessoas e antes de iniciar-se o trabalho tomava-se o mata-bicho.
Os homens agarravam o porco e colocavam-no em cima da banca. O mestre de faca afiada, com um golpe rápido e certeiro, espetava o porco de modo a atingi-lo na zona do coração, provocando o mínimo de sofrimento do animal.
As mulheres colocavam um alguidar com vinho ou vinagre e sal debaixo do porco para aparar o sangue e mexiam durante algum tempo para o sangue não coalhar, sangue esse que seria depois destinado à comida e enchidos.
O porco era chamuscado com mato para queimar a pele e os pelos. Rapavam muito bem o couro com pedaços de telha canudo e lavavam-no com água, sendo que era ponto de honra ficar o porco bem chamuscado e bem lavado. Nesta altura havia brincadeiras e ao lavar as orelhas do porco tentava-se enganar os miúdos que acabavam salpicados com a água que saltava ao dar-se um “murro” na orelha do porco.
Seguia-se a tarefa de abrir o porco de alto a baixo e retirarem as tripas para um alguidar.
As mulheres levavam as tripas para junto de um ribeiro e lavavam-nas para tirar a sujidade. Primeiro eram lavadas com água e depois fazia-se uma mistura com alho, louro e limão, para tirar o mau cheiro das tripas. Todos os dias lavavam as tripas com esta mistura até ao momento de fazer os enchidos.
Depois o porco era pendurado normalmente na adega, com a cabeça para baixo para a carne enrijar e enxugar, utilizando para o efeito o chambaril.
Era servido o petisco com pequenos nacos de carne retirado das abas do porco, bem regado com o vinho da safra. 
Na manhã do dia seguinte, o mestre com a sua arte de desmanchar, desfazia o porco. As mulheres picavam a carne para os enchidos.
Os presuntos eram salgados e colocados na salgadeira, este processo era feito para preservar as carnes.
O almoço do dia seguinte à matança era  um verdadeiro almoço de família, farto e prolongado.
Hoje em dia o abate de porcos é feito em matadouros industriais (e ao contrário do que se possa pensar o processo não é menos doloroso que o tradicional, muito pelo contrário) sendo que em algumas comunidades rurais a criação do porco para sustento familiar ainda persista sendo, no entanto cada vez mais raro.
A carne de porco continua a ser consumida pelas famílias embora a sua qualidade pouco ou nada tenha a ver com a de antigamente.
Do porco, tudo se aproveita para uso culinário - desde o focinho até ao rabo. Mas, apesar da popularidade do suíno, a má fama persegue-o: muitos consumidores associam-no a uma carne gorda e rica em colesterol, o que não é de todo verdade pois depende muito do corte escolhido.
Recentes mudanças nos hábitos alimentares e a maior preocupação com a saúde, tem levado as pessoas a consumiram uma menor quantidade de carne de porco.
A verdade, é que ao longo da nossa vida somos confrontados com uma série de situações que nos obrigam a fazer escolhas, sendo que algumas das escolhas que temos de tomar dizem respeito às nossas opções alimentares.
No seio deste grupo, (constituído por cerca de cinquenta pessoas) também há, quem tenha há muito abolido a carne da sua alimentação, outros continuam a ser carnívoros assumidos. Convivemos bem com as diferenças e com as opções de cada um, dizemos por aqui que se trata de respeito à liberdade de escolha de cada indivíduo, mas talvez isso seja apenas um comportamento associado a gente “atrasada”, pouca instruída, “bárbara” e “anormal”.
Para quem é contra a matança do porco, mas que não se inibe de ameaçar de morte quem não partilha das suas ideias, ou que depois de insultar os outros no Facebook, se senta à mesa a disfrutar de uma bela refeição de carne, peixe, ou de legumes, (pois há também quem defenda que as plantas sentem quando são mastigadas) apenas um pequeno registo no sentido de alertar para a necessidade de respeitar para ser respeitado já que a tolerância passa pela aceitação e pelo respeito às diferenças em relação à cultura, modo de expressão e liberdade.
A tradição da matança do porco surge associada à subsistência das famílias e não a nenhum ritual. Em tempos, a carne obtida nesta altura era a única que a família consumia ao longo do ano.
Assim sendo, e devido à importância que a matança do porco assumia na vida dos nossos antepassados e pelas memórias que muitos de nós temos associadas à verdadeira festa proporcionada pelo encontro e pela partilha das famílias, o Rancho de Alviobeira, pela segunda vez, decidiu fazer a matança do porco, tendo desta vez a colaboração da União de Freguesias Casais Alviobeira, a qual muito agradecemos.
O dia eleito e por forma a conciliar as diferentes atividades promovidas por este grupo e pelas restantes coletividades da freguesia, foi o Domingo Gordo, o último domingo que antecede a quaresma, onde era tradição comer cozido à portuguesa, como despedida da carne, já que a Quaresma era tempo de total jejum.
Assim no sábado, procedeu-se à matança do porco e no domingo ao almoço em família, aberto a todas as pessoas que quiseram associar-se a nós neste evento tão “caseiro”.
O evento coincidiu com o domingo de Carnaval e como o Entrudo também fazia parte das tradições dos nossos antepassados, no final do almoço os caretos apareceram e animaram a festa.

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